Desde o início desse ano venho ouvindo e vendo alguns TEDs (Technology, Entertainment, Design. Em português: Tecnologia, Entretenimento, Planejamento) que, segundo a Wikipedia é uma série de conferências realizadas pela fundação Sapling, dos Estados Unidos, de apresentações limitadas a 18 minutos destinadas à disseminação de ideias – segundo as palavras da própria organização, “ideias que merecem ser disseminadas”. E é isso que realmente tenho encontrado nos TEDs: ideias que merecem ser disseminadas.
Dentre os TEDs brasileiros que já vi, gostei muito da apresentação da Isa Minatel da Mundo em Cores, da Dani Junco da B2Mamy e o do Murilo Gun da Keep Learning School.
É com esse propósito de disseminar ideias que merecem ser disseminadas, que apresento um resumo e comentários sobre o TED de Christopher Bell, que é professor de estudos de mídia e pai de uma menina atlética, como ele mesmo define. O TED é intitulado PROMOVAM AS SUPER-HEROÍNAS, clique aqui para assistí-lo.
Meninas que preferem ser super-heroínas a ser princesas
No início do seu TED, ele mostra uma séria de fotos da sua filha e faz um relato sobre ela:
Esta é a minha filha, e eu acho que vocês adorariam ela. Ela é esperta, engraçada, gentil com as pessoas e uma boa amiga. Mas, quando eu falo sobre a minha filha, a palavra que eu mais tendo a usar é “atleta”. Minha filha é atlética. Ela é forte, e rápida, tem um excelente equilíbrio e bom controle corporal. Ela venceu o campeonato estadual de Shaolin Kempo (de Karatê) nos últimos três anos. Aos nove anos de idade, ela já está a meio caminho da faixa preta.
E ele atribui essas características como sendo reflexo de sua esposa, que foi bicampeã nacional de futebol e vôlei, enquanto ele jogava RPG de mesa. “E é por isso que, apesar da minha filha ser uma atleta, ela também é supernerd, o que eu adoro.”
Tudo isso desenvolveu nela uma verdadeira adoração por super-heroínas.
Mas a pergunta que eu quero fazer é: por que, quando minha filha se fantasia, seja de Groot, seja de Incrível Hulk, seja de Obi-Wan Kenobi ou de Darth Maul, por que todas as fantasias delas são de personagens masculinos? E onde estão todas as super-heroínas? Essa não é bem a pergunta, afinal existem várias super-heroínas por aí.
E ele introduz o principal assunto abordado em seu TED:
A pergunta de verdade é: onde estão os produtos de super-heroínas? Onde estão as fantasias? Onde estão os brinquedos?
A força da mídia
Vivemos em uma sociedade 100% saturada pela mídia. Quer dizer que cada mínimo aspecto da nossa existência humana, exceto as funções fisiológicas básicas, é tocado pela mídia de alguma forma. O carro que usamos, a roupa que vestimos, as músicas que ouvimos.
Então, a resposta da nossa sociedade sobre como aprendemos o que sabemos sobre os outros e sobre o mundo é, principalmente, através da mídia.
E é basicamente por isso que é tão importante que hajam super-heroínas nas prateleiras das lojas de brinquedos: para que as meninas se sintam representadas e, consequentemente relevantes, importantes e respeitadas. Porque nem todas querem ser princesas!
A influência financeira sobre o que é apresentado à sociedade
Mas o problema é mais complexo e a disseminação da informação está vinculada diretamente ao ganho financeiro.
Em 1983, 90% da mídia dos EUA era feita por 50 companhias, o que trazia uma visão de mundo diversificada. Em 2015 esse número caiu para 6: NBCUniversal Comcast, AOL Time Warner, a Walt Disney Company, News Corp, Viacom e a CBS Corporation.
Essas seis empresas produzem nove de cada dez filmes que você assiste, nove de cada dez programas de TV, nove de cada dez músicas, nove de cada dez livros. Agora, minha pergunta é: se seis empresas controlam 90% da mídia americana, quanta influência vocês acham que elas têm no que você pode ver todos os dias?
Se 90% da mídia é produzida por seis companhias a influência delas é absurda. Elas influenciam diretamente o que você pode ver todos os dias seja na televisão, nas prateleiras das lojas de brinquedos, nas prateleiras das livrarias….
A mídia controla a conversa, ao determinar sobre o que vamos conversar. Ela nos direciona a não pensar sobre o que ela não quer que a gente pense. E é isso que ela tem feito com as super-heroínas a não dar a elas um destaque paritário aos super-heróis.
Para exemplificar esse conceito, Christopher Bell cita o exemplo da Disney, que tem 100% de penetração no mercado americano. A Disney ganhou e ganha muito dinheiro vendendo princesas para as meninas.
A menos, é claro, que a princesa favorita da sua filha, como acontece com a minha, seja esta: Princesa Léa.
Segundo ele, depois que a Disney comprou a Lucas filme inundou suas lojas com os personagens masculinos – Han Solo, Obi-Wan Kenobi, Darth Vader, Luke Skywalker, Yoda – menos a princesa Léia. A razão seria que a princesa Léia atrapalha a pedagogia pública das outras princesas.
Segundo Christopher Bell:
A Disney não colocou produtos da Princesa Léia à venda, e quando as pessoas disseram a eles: “Ei, cadê as coisas da Princesa Léia?”, a Disney respondeu: “Não temos planos de colocar produtos da Princesa Léia para vender”. Os fãs ficaram indignados e foram para o Twitter com a hashtag #WeWantLeia. E a Disney disse: “Espera, não é bem assim. O que quisemos dizer é que ainda não temos produtos da Léia, mas vamos ter”. Isso foi em 2012, e já estamos em 2015, e se vocês forem a uma loja da Disney, como eu fiz recentemente, e procurarem produtos da Princesa Léia, sabem quantos vão achar? Zero, pois a Disney não tem intenção nenhuma de colocá-los na loja.”
Reserva de papéis coadjuvantes às mulheres
E isso não devia ser surpresa, pois foi a mesma política que adoraram quando compraram a Marvel em 2009.
E o que isso está nos ensinando? Quer dizer, pelos próximos cinco anos, a Disney, a Warner Bros e um monte de outros estúdios vão lançar mais de 30 longas-metragens de personagens de quadrinhos, e, desses 30 longa-metragens, precisamente dois deles terão protagonistas mulheres. Dois. Claro, haverá mulheres nos outros filmes, mas elas serão companheiras, parceiras românticas, membros da equipe. Elas não serão as personagens principais. E se o que aprendemos, o que sabemos sobre as outras pessoas e sobre o mundo aprendemos através da mídia, então essas empresas estão ensinando à minha filha que mesmo que ela seja forte, esperta, rápida e lute como uma ninja, e tudo que citei acima é verdade, não importa. Ou ela será ignorada, como a Gamora, ou será apagada e substituída por um menino, como a Viúva Negra. E isso não é justo. Não é justo com ela e não é justo com seus filhos e filhas também.
Ele cita ainda a importância de comprar as poucas super-heroínas que estão representadas no mercado não apenas para as nossas filhas, mas também para os nossos filhos.
Porque é importante que garotos brinquem com e como super-heroínas, da mesma forma que minha filha brinca com e como um super-herói.
Se o que sabemos sobre as outras pessoas e sobre o mundo aprendemos através da mídia e se às mulheres estão sendo reservados apenas papéis coadjuvantes, sem dar a elas os personagens principais, estamos diminuindo a sua força e sendo injustos como sociedade com nossos filhos e filhas.
A Mattel lançou as bonecas DC Super Hero Girls, que vêm acompanhadas “dos equipamentos que as ajudam a derrotar os inimigos”. São inspiradas nas incríveis alunas de Super Hero High.
Como decidir se um brinquedo é para menina ou menino?
E Christopher Bell termina o seu TED Talk de uma forma sensacional:
E por falar nisso, eu adoraria um mundo no qual toda pessoa que fosse a uma loja, fosse com um pequeno passo a passo em sua cabeça que diria se deveria ou não comprar tal brinquedo para um garoto ou uma garota e seria um passo a passo bem simples, pois teria apenas uma questão.
Ele diria: “Para usar este brinquedo eu preciso das minhas genitais?”
Se a resposta for “sim”, então não é um brinquedo para crianças.
E se a resposta for “não”, então é para meninos e meninas.
É muito simples.
Porque aqui estamos falando sobre o futuro do futuro, e no meu futuro, meninos e meninas são igualmente respeitados, igualmente valorizados, e o mais importante, igualmente representados.
Dissemine a ideia para que possamos tornar o nosso mundo mais justo!