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O relato da minha cirurgia para correção de CIV (Comunicação Interventricular)

por Thainá Halac
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Eu  fui um bebê cardiopata. Nasci com CIV (Comunicação Interventricular). Na prática, o famoso “sopro”, que no meu caso era quase um rombo. À época que nasci, em 1984, o pré-natal não conseguia identificar nenhuma má-formação cardíaca no feto. Foi ao nascer, logo no primeiro exame, que o médico deu a notícia aos meus pais, que começaram uma verdadeira saga para entender a doença, os cuidados necessários e me salvar. Um cateterismo logo depois constatou o diagnóstico feito na maternidade.

Trinta e quatro anos atrás a técnica da cirurgia indicada ainda não era muito difundida e os hospitais públicos não ofereciam a cirurgia corretiva para bebês, pois precisava de aparelhos específicos que ainda não haviam sido adquiridos pelo sistema de saúde.

A opção, então, seria fazer fora do país, mas apesar de ser de família de classe média, os custos eram extremamente elevados e a esperança de cura ficava cada dia mais distante. Meu pai era professor universitário e minha mãe abandonou a profissão de psicóloga para se dedicar a mim – eu precisava de cuidados exclusivos, já que não poderia ter nenhuma infecção, contrair nenhuma bactéria, nenhuma pneumonia. Tudo meu era limpo e esterilizado ao extremo, com cuidados redobrados.

Para que a cirurgia fosse feita, além do dinheiro, meu corpo teria que ter condições de suportar a circulação extracorpórea. Para isso, eu deveria ganhar peso – o que não acontecia com facilidade. Sério, recentemente vi a roupa que usei no meu aniversário de um ano e era do tamanho de um bebê recém-nascido.

Paralelo a isso, meu pai seguia dando aula e palestra em todos os lugares para conseguir se capitalizar para a intervenção cirúrgica. Um dia, dando aula na extinta Universidade Gama Filho para o curso de medicina, começou a chorar em sala e os alunos perguntaram o motivo. Era eu e meu coração, que poderia parar de bater a qualquer momento se a cirurgia não fosse feita.

Por acaso, um dos alunos era neto da dona da Universidade, que à época mantinha um hospital para residentes. Comovido com a situação do professor, ele relatou à avó, que procurou o meu pai querendo mais informações sobre o meu caso.

Ela decidiu importar o aparelho para o Hospital da Gama Filho, onde a equipe médica que me acompanhava realizou a cirurgia, sem nenhum custo.

Operei com 18 meses e a cirurgia para correção do CIV foi um sucesso! Gratidão eterna por quem viabilizou e aos meus pais, que nunca desistiram da minha vida.

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Como foi a infância com o CIV corrigido?

Na minha cirurgia foi usado enxerto de porco para ajudar a fechar o sopro. Uma parte de pele da minha perna também foi raspada para a recomposição do tecido. Grampos foram usados para fechar o tórax, que precisou ser serrado para que a cirurgia fosse feita.

Minha mãe conta que eu não podia cair durante algum tempo, então cuidados redobrados mais uma vez. Sim, eu cresci cercada de atenção e muito amada. Nunca tive limitações, não me lembro de ter tomado remédios para o coração (mamãe diz que eles foram necessários durante um tempo, mas não me recordo).

Restaram somente boas lembranças: sempre adorei “palestrar” sobre a minha cicatriz em formato de zíper no meio dos peitos. Fiz todos os esportes: natação, dança, participava ativamente das aulas de Educação Física.

Até as consultas periódicas na Carpe, consultório em Botafogo, no Rio, que acompanhava meu caso, eram motivo de festa. Acostumei a fazer exames de sangue, teste de esforço, eletrocardiograma e eco desde cedo. Para mim era algo absolutamente normal. Felicidade maior só quando eu colocava o holter para monitorar meus batimentos cardíacos. E olha que na minha infância o aparelho era um monstro, que eu exibia toda boba no colégio (porque eu adorava virar o centro das atenções).

Cada vez que saíamos do consultório e os médicos constatavam que estava tudo bem era uma festa! Eu não dimensionava a importância daquele momento, mas hoje sendo mãe, imagino o alívio dos meus pais.

Além disso, as consultas ao dentista também sempre foram periódicas, pois uma cárie pode ser um canal de entrada para bactérias que chegam rapidamente ao coração. Como ficou um resquício de sopro da cirurgia, não posso descuidar.

Mais tarde, na adolescência, a cicatriz começou a incomodar. Cheguei a ir a um cirurgião plástico e a vários dermatologistas para ver se ela poderia sumir. Queria todas as roupas de gola alta, de modo a esconder a cicatriz. Adolescente é bicho bobo mesmo, né?

Durou pouco a fase da vergonha pelo meu “zíper”. Logo percebi que não era impeditivo para nada. Passei a usar decotes e biquínis. Não ligo a mínima, pelo contrário: adoro exibir minha marquinha. Fiz questão que ela aparecesse no meu vestido de casamento e na roupa que escolhi para o aniversário do meu filho.

Pronta para casar, exibindo minha cicatriz

Mantive uma vida saudável, com boa alimentação, longe de drogas, com prática de esportes.

Morro de orgulho do meu coração recauchutado e da cicatriz entre o meu peito que me lembra todos os dias da cirurgia que me salvou! Nunca tive restrições, tenho uma vida absolutamente normal, apenas com revisões periódicas no cardiologista. Já corri maratona, já pari e sigo na luta para que mais crianças tenham o diagnóstico precoce e consigam obter a cura!

Como é engravidar com CIV corrigido?

É normal. Como qualquer outra mulher que não passou por nenhuma cirurgia. Tive uma gestação com pré-natal idêntico a todas as outras gestantes, só que com o acompanhamento da minha cardiologista.

Todo mês fazíamos exames para verificar como estava meu músculo involuntário e ele se comportou perfeitamente durante os nove meses.

Durante a gravidez, cerca de 20 litros de sangue a mais circulam pelo corpo da gestante. Essa quantidade poderia sobrecarregar e comprometer o funcionamento do meu coração, mas o máximo observado foram algumas arritmias, perfeitamente suportáveis e que não ofereciam nenhum risco à minha vida e nem à do bebê.

A minha obstetra optou pela cesariana por não saber como meu coração poderia reagir ao esforço do parto. Amamento até hoje tranquilamente e não tive nenhuma intercorrência.

Outra preocupação era a hereditariedade: a cardiopatia podia passar para o feto, mas já na ultrassonografia morfológica constatamos que o coração do Felipe funcionava perfeitamente. Também fizemos o ecocardiograma fetal, que comprovou Felipe não havia herdado a má-formação. Com um mês de nascido levei meu bebê para fazer mais exames no cardiopediatra, que descartou qualquer anomalia.

 

Conhece alguém que tenha vencido a cardiopatia congênita? Compartilhe a história conosco!

 

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